Sinuca de Bico – Full Energy Magazine

Confira o terceiro artigo do nosso diretor, Sérgio Costa, na Full Energy Magazine

O diretor da VILCO Engenharia e Consultoria, Sérgio Costa inaugura sua coluna – Energia Em Foco – na Full Energy Magazine, com tiragem nacional e internacional, trazendo seu segundo artigo na 25º edição da revista, intitulado “Sinuca De Bico”.

De acordo com participantes do 14º Encontro Nacional de Agentes do Setor Elétrico (ENASE), os maiores desafios do setor atualmente são o “Fim da Judicialização no Setor” e o “Reequilíbrio Econômico-Financeiro” das empresas do setor.

Em seu artigo, Sérgio discorre sobre os fatores que levaram o setor energético brasileiro à beira do colapso e apresenta soluções para que possamos sair desta “Sinuca de Bico”.

Confira abaixo o texto na íntegra:

Sinuca de Bico

Para reestruturar e redirecionar o setor elétrico brasileiro, o diálogo e a negociação entre todos os agentes é fundamental.

Em pesquisa realizada com os participantes do maior fórum de discussões dos agentes do setor elétrico brasileiro, o Encontro Nacional de Agentes do Setor Elétrico (ENASE), em sua 14ª versão em maio de 2017, apontou que as questões mais urgentes a serem resolvidas no setor elétrico são o “Fim da Judicialização no Setor” e o “Reequilíbrio Econômico-Financeiro” das empresas atuantes no segmento.

Na Medida Provisória 579, de 11 de setembro de 2012, convertida posteriormente na lei n° 12.378, o Governo Federal tinha por objetivo a diminuição da tarifa da energia paga pelo consumidor final (inicialmente estimada pelo governo em até 18% para o consumidor residencial e 32% para o industrial) por meio do mecanismo da não renovação das concessões de geração de energia hidrelétrica, uma possibilidade prevista nos contratos de concessão de cada usina. Possibilidade esta que até então não havia sido profundamente debatida ou discutida com o mercado de energia elétrica, mas apenas entre os integrantes do Comitê Nacional de Política Energética (CNPE), formado somente por representantes do governo.

Assim, a MP 579 provocou um distúrbio regulatório em que os efeitos foram amplificados até o presente, se tornando um marco no setor que até então se caracterizava pela estabilidade e segurança jurídica. A insegurança para novos investimentos se tornou uma realidade, e diversos agentes do setor, investidores, operadores, consumidores e governo entraram em uma espiral de discussões contratuais e jurídicas em que as principais divergências foram:

  • o direito às renovações de algumas concessões de geração e transmissão;
  • nova sistemática imposta para o rateio de encargos ditos relacionados à segurança do sistema elétrico; e
  • a falta de isonomia entre os consumidores livres ou especiais, que contratam energia no Ambiente de Contratação Livre (ACL), o Mercado Livre, e consumidores cativos que contratam energia das distribuidoras, o Ambiente de Contratação Regulada (ACR).

A judicialização do Generation Scaling Factor (GSF) até o final de 2017, cujo fator previsto é atingir 80,8% da Garantia Física do Sistema, deverá gerar um impacto financeiro total de R$ 39,7 bilhões, sendo R$ 26,7 bilhões no Mercado Regulado e R$ 13 bilhões no Mercado Livre.

Outro fator de judicialização do setor está entre os agentes de geração de Usinas Hidrelétricas (UHEs com potência instalada superior a 30 MW) e de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs, com potência entre 5 e 30 MW) participantes do Mecanismo de Realocação de Energia (MRE), em que a participação é compulsória pelas UHEs e optativa pelas PCHs. Este é um mecanismo financeiro que visa o compartilhamento dos riscos hidrológicos, que afetam os agentes de geração hidrelétrica. Ele tem por objetivo otimizar os recursos energéticos do Sistema Interligado Nacional (SIN) e, portanto, minimizar os custos operacionais para manter o menor custo marginal de operação possível, por meio da otimização do despacho da geração termelétrica no sistema hidro-termo-eólico que integra o SIN.

A criação do MRE está fundamentada pela característica geográfica de grandes dimensões do país, em que os ciclos de chuva (hidrológicos) variam grandemente entre as regiões macros que compõem o Sistema – os subsistemas Sul, Sudeste/Centro-Oeste, Nordeste e Norte -, com períodos de seca e de chuvas historicamente não coincidentes entre estas regiões. O MRE realoca contabilmente a energia gerada por fonte hídrica, transferindo o excedente das usinas que geraram além da Garantia Física contratada para aquelas que geraram abaixo do contratado. A Garantia Física ou Energia Assegurada da usina hidrelétrica estabelece o limite de comercialização de energia da usina. Esta garantia é definida e revisada pela EPE (Empresa de Pesquisa Energética) e pelo MME (Ministério de Minas e Energia), considerando critérios de operação da planta e do sistema, a segurança energética, e a disponibilidade hídrica. O critério da EPE para a atribuição de Garantia Física admite um risco máximo de déficit de 5%. Para a Garantia Física de cada usina hidrelétrica é alocada uma fração da Garantia Física total do Sistema.

Outro conceito importante é o Generation Scaling Factor (GSF), que é a relação entre o volume de energia efetivamente gerado pelo MRE e a Garantia Física total do mecanismo, ou seja, do Sistema. O GSF é medido em base mensal e caso seja maior que 100%, caracteriza-se um “excedente” de energia contratada das usinas hidrelétricas, a chamada “energia secundária”. Nesta situação, todos os agentes de geração que fazem parte do MRE possuem energia suficiente para atender e honrar aos seus valores contratuais e também repartir os seus benefícios, a energia secundária. Porém, o problema ocorre se há período seco, ou seja, escassez de chuvas em todos os subsistemas, característico de determinados ciclos climáticos plurianuais.

O maior destes períodos históricos de seca conhecidos até então foi de junho de 1949 a novembro de 1956, o chamado “período crítico” hidrológico do setor elétrico. Naquela época, existiam poucas usinas hidrelétricas comparadas com hoje e não havia o MRE, mas as usicas existentes atendiam plenamente ao consumo. Desde 2014, a situação é de escassez de chuvas em todas as macrorregiões do país, e os reservatórios das usinas hidrelétricas não conseguem recuperar um nível de água seguro para armazenamento, fator que tem resultado em um GSF abaixo de 100%. Com isto, o Operador Nacional do Sistema (ONS) tem que despachar as termelétricas, mais do que o planejado, para a garantia de abastecimento e a segurança energética. O GSF abaixo do valor esperado tem resultado em débitos a serem pagos por quase todos os geradores hidrelétricos, os quais devem realizar a aquisição da energia faltante para honrar seus compromissos no Mercado de Curto Prazo. Esta energia é mais cara que a originalmente contratada junto às usinas hidrelétricas pelas distribuidoras ou pelos agentes comercializadores. Assim, estes agentes de geração acumularam prejuízos bilionários.

Todo este cenário de instabilidade e de falta de credibilidade no marco regulatório, causado pela judicialização do setor, bem como o desequilíbrio econômico-financeiro das empresas, colocam todo o setor em risco de colapso.

Conforme dados recentes apresentados pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), os valores “em aberto” na liquidação do Mercado de Curto Prazo em razão de liminares judiciais, decorrentes do GSF, passaram de R$ 1 bilhão em fevereiro de 2016, com 130 liminares na justiça, para R$ 1,6 bilhão em março de 2017, com 151 liminares. E o pior ainda está por vir: a projeção de judicialização do GSF até o final de 2017, cujo fator previsto é atingir 80,8% da Garantia Física do Sistema, de um impacto financeiro total de R$ 39,7 bilhões, sendo R$ 26,7 bilhões no Mercado Regulado e R$ 13 bilhões no Mercado Livre.

O princípio de estabilidade econômico-financeira – um princípio constitucional garantido aos contratos de concessão das usinas hidrelétricas – permitiu aos agentes de geração provocar uma avalanche de liminares e medidas judiciais com o objetivo de cessar e rever os prejuízos. Todo este cenário de instabilidade e de falta de credibilidade no marco regulatório, causado pela judicialização do setor, bem como o desequilíbrio econômico-financeiro das empresas, colocam todo o setor em risco de colapso.

Entendo que somente por meio do diálogo e da negociação entre todos os agentes, e com medidas e mudanças regulatórias focadas na razoabilidade, racionalidade e eficiência, é que o Setor Elétrico Brasileiro poderá se reestruturar e redirecionar seus esforços para que possamos sair desta “Sinuca de Bico”.

Por: Sérgio Costa, diretor-executivo da VILCO Engenharia e da EMD Brasil

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